A UTI Neonatal da Santa Casa de Santa Cruz do Rio Pardo pode fechar as portas caso novos profissionais não sejam contratados. Na terça-feira (21), seis médicos que prestam serviço na unidade entregaram seus cargos de plantonistas, inclusive a responsável técnica pelo setor, Kátia Bernardes Henares. Em ofício enviado à diretoria do hospital, ao qual o Diário Cidadão teve acesso, os médicos alegam falta de condições adequadas de trabalho, como a redução crítica do número de plantonistas, além da impossibilidade de manutenção da assistência 24 horas. O documento diz ainda que tais problemas já foram relatados em ofícios anteriores, sem solução. Segundo apurou o Diário Cidadão, outro ponto de insatisfação é o salário defasado em relação a outras cidades da região. Enquanto a Santa Casa de Santa Cruz paga R$ 120 a hora, as de outras localidades pagam R$ 160 por hora. Fontes médicas relatam que há sete anos não ocorre reajuste.
“Em respeito ao Código de Ética Médica e aos nossos pacientes, manteremos nossas funções e cobertura assistencial pelo período de 30 (trinta) dias a contar desta data, prazo considerado suficiente para que a administração adote as providências necessárias à reorganização da equipe e continuidade do serviço”, diz trecho do ofício. “Reforçamos que esta decisão é tomada com profundo pesar, após inúmeros esforços de negociação e tentativas de manutenção do serviço que, há 19 anos, vem prestando assistência de excelência aos recém-nascidos de nossa região.”
A advogada e gerente administrativa da Santa casa de Santa Cruz do Rio Pardo, Roselis Franciscon disse ao Diário Cidadão que a UTI não vai fechar. Segundo ela, no prazo de 30 dias, novos profissionais serão contratados. Quanto ao valor pago aos médicos Roselis confirmou que são R$ 120 a hora e que um aumento depende de tratativas com a Prefeitura que já estão em andamento.
Além de Katia Henares, assinaram o ofício para se desligar da UTI Neonatal no prazo de 30 adias as médicas Ana Cláudia Sanches, Cristina Velásquez Nardi, Hortênsa Camarinha Figueira, Luciana Pegorer e Silvana Egaki.
Em suas redes sociais, Kátia Henares fez um desabafo de despedida. Leia na íntegra:
Carta Aberta à Comunidade de Santa Cruz do Rio Pardo
Santa Cruz do Rio Pardo, 22 de outubro de 2025
Há 19 anos, movida pela dor de ver tantas vidas começando e terminando antes do tempo, nasceu em mim um propósito: mudar a história da mortalidade infantil em nossa cidade.
Com o apoio de muitas pessoas de boa vontade, da comunidade e de lideranças locais, sonhei, planejei, batalhei e ajudei a construir algo que parecia impossível: uma UTI Neonatal em Santa Cruz do Rio Pardo.
Foi através da ONG Maria Vitória (que recebeu esse nome em homenagem a uma criança que faleceu com apenas dois dias de vida, a gota d’água que me fez decidir que nenhuma outra vida deveria se perder por falta de estrutura) que conseguimos levantar recursos, unir forças e transformar esse sonho em realidade.
Desde então, vivi uma vida inteira dentro daquela UTI. Foram milhares de bebês salvos, milhares de famílias acolhidas, incontáveis noites em claro e lágrimas de alegria por cada alta conquistada. Aquele espaço se tornou a missão da minha vida, um símbolo do que acredito ser a verdadeira medicina: o cuidado com amor, respeito e propósito mas, infelizmente, o que nasceu de um ideal passou a ser sufocado por algo que nunca fez parte dessa missão: a POLÍTICA.
Nos últimos anos, a troca de administrações na Santa Casa e a falta de diálogo tornaram o ambiente insustentável. Vi colegas desistindo, profissionais adoecendo e a essência do nosso trabalho sendo substituída por disputas que nada têm a ver com salvar vidas.
Tentei resistir. Enviei ofícios, busquei conversas, pedi ajuda. Não houve resposta. Até que, diante da demissão coletiva da equipe e do desgaste emocional que se tornou insuportável, percebi que meu tempo ali havia se encerrado.
Hoje, com o coração apertado, comunico à sociedade minha renúncia ao cargo de responsável técnica da UTI Neonatal da Santa Casa de Santa Cruz do Rio Pardo.
Saio com dor, mas também com orgulho. Porque sei que cumpri minha missão e que cada vida salva continuará sendo o maior legado da minha trajetória. Enquanto ali existia medicina, amor e propósito, aquele lugar era minha casa. Mas quando a política tomou conta e a medicina deixou de ser o foco, entendi que era hora de partir.
Levo comigo a certeza de que o que nasce do amor jamais se apaga. E que, mesmo fora das paredes da UTI, continuarei acreditando na força da vida e na medicina feita com alma e vocação.
Com gratidão,
Dra. Kátia Henares
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